sábado, 23 de enero de 2010

"Com o Pé sobre um Vulcão": Africanos Minas, Identidades e a Repressão Antiafricana no Rio de Janeiro (1830-1840)

GRABADO:Jogo de capoeira na Bahia, década de 1820.
http://saladepesquisacapoeira.blogspot.com/2009/08/1733-carolina-del-sur-boxeador-y.html

"Com o Pé sobre um Vulcão": Africanos Minas, Identidades e a Repressão Antiafricana no Rio de Janeiro (1830-1840)

Carlos Eugênio Líbano Soares e Flávio Gomes
Resumo
Este artigo busca retratar o terror que assomou os moradores brancos da cidade do Rio de Janeiro quando do êxodo crescente de africanos ocidentais da cidade de Salvador, na Bahia, para o Rio de Janeiro, principalmente após a derrota do levante malê de 1835. Discute também a questão das identidades políticas construídas pelos africanos ocidentais ocultas sob o manto de identidades "étnicas", geralmente muito mal discutidas pelos historiadores. Também debate o medo da "politização" do protesto escravo que assolou os senhores do Rio nos anos 1830, dentro do quadro maior de inconformismo com os políticos conservadores na Regência.

O segundo semestre de 1835 continuou tormentoso para as autoridades. Além dos capoeiras, número significativo de escravos são presos por conduzirem armas, ou mesmo por desacato a autoridade. Uma simples comparação dos boletins mensais de prisão, de 1833 e 1834, demonstram a escalada insurreta. Mais do que nunca, as ruas da Corte em 1835 são tomadas pela maioria africana e escrava na cidade. Nem os símbolos visíveis da dominação, como os libambos de negros acorrentados, intimidam a avassaladora onda rebelde que percorre a cabeça dos pretos e pretas da cidade. Os proprietários brancos ficam enclausurados em suas casas, com medo da onda negra nas ruas.
A vaga revolucionária que toma o Império, fazendo eclodir levantes de Norte a Sul do país, chega inevitavelmente à capital do Império, e não vem somente da Bahia. Felipe Moçambique, ao ser levado para o Calabouço do Castelo para ser supliciado, fez amaldiçoar seus captores, pois "disse que havia de acontecer aqui o mesmo que aconteceu no Pará", onde a rebelião dos cabanos tomou o poder na capital da província (ANRJ, IJ 7, "Partes...12.11.1835"). A Corte não estava de modo nenhum isolada do contexto do Império. E o contexto do Império era também Atlântico.
Em alguns momentos – como Chalhoub bem definiu – nas ruas da Corte, o medo ficaria sólido como uma rocha. Em julho de 1835, um estranho ofício foi parar na mesa do temido chefe de polícia da Corte, Eusébio de Queiroz Coutinho Matoso Câmara. Era sobre a apreensão, junto a africanos, de um papel escrito com "bizarros sinais", aparentando ser um alfabeto indecifrável. Ninguém na repartição policial soubera decifrar tais escritos. Para decifrador foi convocado um africano nagô. O africano – não sem aparentar dificuldade – prontamente afirmou que aquele era um alfabeto usado por um povo que vivia ao norte de sua terra original, na África Ocidental, para onde os jovens de famílias proeminentes eram mandados, e que era usado pelos sábios de sua gente. Pausadamente ele traduziu o que parecia uma prece muçulmana, mas que reproduzia um diálogo entre defensores da paz e apologistas da "guerra". Não pode haver dúvidas que a tal "guerra" na realidade era um sinônimo para rebelião.16
16. ANRJ, Ij6 170, jan.jul. 1835, ofício do chefe de polícia ao ministro da justiça.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-546X2001000200004

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